sexta-feira, 23 de setembro de 2016

A “Caducidade” das Dívidas após o ajuizamento de Ações

A “CADUCIDADE” DAS DÍVIDAS APÓS O AJUIZAMENTO DE AÇÕES


Iury Andreone Pena Souza
Advogado Associado de Homero Costa Advogados

O credor de determinada obrigação dispõe de diversos procedimentos judiciais para, nos casos de resistência do devedor, afastar o estado de inadimplência e satisfazer a sua pretensão, ainda que coercitivamente. Tal assertiva pode ser verificada, especificamente, nos procedimentos de caráter executivo, nos quais se prioriza o interesse do exequente (artigo 612 do revogado CPC/1.973 e artigo 797 do CPC/2.015).
No entanto, o ordenamento jurídico é norteado pelo princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança, de modo a se alcançar a pacificação dos conflitos de interesses. Assim, a pretensão do credor deve ser exercida em um determinado período de tempo, sob pena de ser extirpada pela prescrição – perda do direito de continuar cobrando a dívida, tecnicamente intitulada como prescrição intercorrente, capaz de erradicar a pretensão exercida.
Em outras palavras, a ineficácia do direito de agir se consuma no curso da demanda, especificamente na hipótese em que o credor se mantém, injustificadamente, inerte na prática dos atos processuais, ocasionando a paralisação desmotivada do processo, o que não é tolerado pelo ordenamento jurídico.
Neste sentido, o Supremo Tribunal Federal editou a súmula de nº 150[1], reconhecendo a possibilidade da prescrição da pretensão executória pelo mesmo prazo da ação, gerando a perda do direito de continuar cobrando a dívida, quando decorrido prazo igual ou superior ao prazo que o credor tem, de cobra-la.
O Superior Tribunal de Justiça já teve a oportunidade de decidir que “o reconhecimento da prescrição intercorrente vincula-se não apenas ao  elemento temporal mas também à ocorrência de inércia da parte autora em adotar providências necessárias ao andamento do feito” (AgRg no AREsp 33.751/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/11/2014, DJe 12/12/2014).
Essa Corte Superior, atenta às alterações advindas com a promulgação do novo Código de Processo Civil, em julgamento paradigma, firmou o entendimento de que a prescrição intercorrente ocorre se o exequente permanecer inerte por prazo superior ao de prescrição do direito material vindicado” (REsp 1522092/MS, Rel.  Ministro  PAULO  DE  TARSO  SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/10/2015, DJe 13/10/2015).

De igual modo, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais admite a prescrição intercorrente nos casos em que o próprio titular da pretensão permanece inerte, não realizando ato ou diligência que lhe incumbia durante o processo (TJMG – Apelação Cível 1.0701.01.000450-8/001, Relator (a): Des.(a) Mariângela Meyer, 10ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 24/05/2016, publicação da súmula em 17/06/2016).
A prescrição intercorrente é fenômeno endoprocessual e, por isso mesmo, vinculada a um dado processo. Sua aplicação pode ocorrer em qualquer procedimento, tenha ele função cognitiva ou executiva, já que tem por objetivo proteger a segurança jurídica e a pacificação das relações sociais.
Cumpre ressaltar, no particular, que a Lei de nº 6.830/80, ao tratar sobre a cobrança judicial da dívida ativa da fazenda pública, dispõe especificamente sobre a incidência da prescrição intercorrente. O §4º do artigo 40 da mencionada lei determina que se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato”.
No âmbito das relações jurídicas de direito privado, não havia dispositivo legal semelhante, ensejando o surgimento de controvérsia acerca da aplicação da prescrição intercorrente nessa seara. Isto porque, o revogado CPC/1.973 não estabelecia prazo específico para a suspensão da execução, o que ensejava dúvidas sobre a definição do marco inicial da prescrição.
Neste contexto, a Lei nº 13.105 de 2015 (Novo CPC), superando a celeuma instaurada pela omissão legislativa, introduziu novas regras sobre a prescrição intercorrente, aplicáveis a todos os processos de natureza cível.
Conforme regramento ditado pela nova legislação processual, tendo sido suspensa a execução por ausência de bens penhoráveis (inciso III, do artigo 921, do CPC/2.015), o juiz suspenderá a execução pelo prazo de 1 (um) ano, durante o qual se suspenderá a prescrição” (§1º, do artigo 921, do CPC/2.015) e, caso decorrido o mencionado prazo sem manifestação do Exequente, começa a correr o prazo da prescrição intercorrente” (§4º, do artigo 921, do CPC/2.015).
Além disso, conforme evidencia o disposto no §5º do artigo 921 do CPC/2.015, somente quando do reconhecimento judicial da prescrição se faz necessária à oitiva das partes, eliminando a necessidade de prévia intimação do exequente para dar andamento ao feito (v.g. REsp 1522092/MS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/10/2015, DJe 13/10/2015).
Denota-se, portanto, que o CPC/2.015 reconhece expressamente a prescrição intercorrente como uma das causas de extinção da execução, conforme enuncia o inciso V de seu artigo 924.
Logo, o novo Código de Processo Civil inovou o ordenamento jurídico pátrio ao tratar, com detalhes, sobre a prescrição intercorrente e, especialmente, definir o seu marco inicial, nas hipóteses em que houver a suspensão do processo.
Por fim, ainda se faz necessário registrar que, em decorrência do efeito atrativo do artigo 513, do CPC/2.015, o novo regramento processual sobre a prescrição intercorrente também se aplica, de igual modo, à fase de cumprimento de sentença, ante a sua manifesta compatibilidade.




[1] Prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação.

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